quarta-feira, 14 de novembro de 2012

21. Reunited Family



Respirando fundo e reunindo coragem, Yuudai começou a subir as escadinhas de pedra. Dessa vez não havia Luna lhe guiando, e ele não era um “fantasma”.

- Meow? – ele ouviu. 
Olhando para os lados, encontrou Marie. Ela o olhava com cautela, meio escondida atrás de uma árvore.

- Olá? – Yuudai sorriu, sem jeito. – Você é... Marie, não é?

Ela arregalou os olhos verdes e felinos que já eram anormalmente grandes.
Lenta e sinuosamente andou até o estranho, como um gato que se aproximava pela primeira vez de algum humano com quem havia simpatizado.

- Meow... Olá. – ela disse por fim, e retribuiu o sorriso. – Veio visitar alguém? 

- Sim, a dona desta casa... Nana. – pensava se devia ter dito que era o irmão dela.

- Vou chamar a Nana pra você, moço. Pode ficar à vontade, pode brincar com o meu novelo. – e tirou de um dos bolsos do casaco largo um novelo de lã vermelho, já sujo e meio molhado. “Será que isso aqui é baba?” pensou com receio, mas forçou um sorriso para a menina que animadamente correu até a parte de trás da casa, gritando um “Já volto!”.

Esperou apenas uns dois minutos, até que Nana aparecesse andando em sua direção, vindo pelo mesmo caminho no qual Marie sumira.

- Você é... – Nana parecia desconcertada. A surpresa que sentiu ao vê-lo era visível em seu rosto.

- Eu seu irmão. – não sabia ao certo o motivo, mas não conseguiu dizer isso olhando nos olhos dela. Estava com a cabeça meio baixa, e passou a concentrar a atenção no novelo vermelho em suas mãos quando percebeu que Nana estava demorando a responder.

- Me siga, por favor... Vamos entrar.

Yuudai foi atrás dela. 
Nana estava irritada? Ou será que apenas não sabia como reagir?
Sentia-se ansioso demais.

- Pode deixar o novelo da Marie aí na mesinha. – Nana disse simpaticamente, antes de entrarem num cômodo pequeno do primeiro andar, que parecia uma biblioteca. Ela fechou a porta atrás de si.
 Era simples e tudo no lugar parecia ser feito de madeira. Muitos e muitos livros desafiavam o espaço físico do ambiente. 

Sentou-se de frente para Nana, quando esta indicou uma cadeira na mesma mesa em que havia sentado.

- Seu nome é Yuudai, não é? – perguntou em tom casual. 

A aparente indiferença da irmã o deixava ainda mais nervoso.
Será que ela o aceitaria?

- Sim. – na verdade sentiu-se feliz em ver que ela não esquecera o nome assinado na única carta que ele a enviou uma vez, quando ela ainda morava e estudava no colégio interno para órfãos.  Na carta ele apenas dizia que eram irmãos, coisa que ele havia acabado de descobrir. Prometeu que um dia se encontrariam.

- Será que pode... Me contar tudo?

- Hm... Tudo? – perguntou, sorrindo nervosamente. – Como assim?

- Tudo sobre a sua vida, tudo que sabe sobre nossos pais, tudo sobre seu envolvimento com a Yakuza, sobre ter saído uma noticia num jornal francês que dizia que você havia sido morto, tudo sobre o porquê de você nunca ter isso atrás do seu filho... – ela foi falando calmamente.

Yuudai engoliu em seco, e precisou respirar fundo algumas vezes antes de tentar começar a falar. Iria responder a todas as perguntas da irmã, com sinceridade. Sabia que se queria começar uma vida nova ao lado da família, precisava fazer isso sem mentiras.

Ficaram conversando naquele cômodo por seis horas.





A conversa havia fluído bem até então.
Mas quando Yuudai chegou à parte onde ia explicar o que fez com que abandonasse a vida na máfia de vez, o que acontecera antes da visita de Luna... Ele não conseguiu falar.

- Yuudai? Me conte, o que houve antes de Luna? – Nana não conseguia controlar a ansiedade que sentia por essa parte da história que Yuudai havia pulado, dizendo que explicava depois - Você... Quer falar sobre isso depois? – achou melhor sugerir, vendo como Yuudai tentou disfarçar as mãos trêmulas ao escondê-las embaixo da mesa, sobre as pernas.

- Não, eu... Não tem problema. É só que... Eu ainda não falei sobre isso com ninguém... –Na verdade, Yuudai nunca havia contado coisa alguma de sua história para ninguém. O motivo que o levava a hesitar tanto a contar este pedaço da história era o medo que tinha em relembrar o que havia sentido naquele momento.

Nana pela primeira vez levantou da onde estava. Arrastou sua cadeira até deixa-la ao lado da de Yuudai. Sentou-se inclinada, muito mais próxima ao irmão.

- Se não estiver se sentindo bem, realmente podemos continuar em outro momento. – ela disse suavemente.

Ele também se sentou inclinado, a fim de ficar cara a cara com a irmã.

- Bem... Como eu disse, meu objetivo de vida havia se tornado a vingança. – ele começou a falar, desta vez sem levantar o rosto, apenas fitando as mãos sobre as pernas. – E isso durou anos. Por muitos anos, fui me aproximando do homem que eu descobri ter sido o mandante do assassinato dos nossos pais. Eu queria mata-lo quando tivesse chance, sem que ninguém pudesse descobrir, e depois disso sumir do mapa. Aí quem sabe eu fosse atrás de você ou de Louis. Chegou uma época em que fiquei impaciente, e meu estresse e ansiedade estavam piores que nunca... Eu só pensava em mata-lo. Via nisso a minha única libertação. Até que chegou a minha oportunidade... Ele teria que viajar com mais alguém da Yakuza, para fazer algum tipo de transação comercial com a máfia italiana. Nem lembro o que era, eu estava tão doente de estresse e de sede de vingança que tem muitas coisas dessa época que eu sequer consigo lembrar. – ele fez uma pausa. As mãos tremiam. – Só que, no dia combinado, os italianos nos traíram. Roubaram o dinheiro e... Mataram ele. Pode imaginar como fiquei, né? Matar aquele homem era meu único objetivo... E eu nunca mais poderia fazer isso.

Ficaram em silêncio.
Nana pousou suas mãos sobre as de Yuudai, num gesto carinhoso.

- Eu sei que tem mais alguma coisa... Mas tudo bem você não me contar. – ela lhe sorri, e ele a olha um pouco surpreso, mas sente-se grato. – E mais uma coisa... Yuudai, posso contar isso tudo para os outros? Contar aos adultos, eu quero dizer. Nós aqui mantemos uma relação de confiança muito, muito forte.

Um pouco hesitante, Yuudai balançou a cabeça afirmativamente.

E quando finalmente levantaram, se abraçaram.
Foi um abraço apertado e nenhum dos dois teve pressa alguma em termina-lo.

- Vamos lá, deixe-me apresenta-lo formalmente a todo mundo! E você deve estar ansioso para abraçar seu filho também. – saíram da biblioteca, com Nana o levando pela mão.


Yuudai não conseguiu se controlar ao finalmente ver o filho. Louis pareceu reconhecê-lo no momento em que lhe olhou, pelo modo como simplesmente correu até o pai, abraçando-o com todas as suas forças.
Yuudai estava sem palavras, apenas conseguia corresponder ao gesto do filho. Acabou ajoelhando-se no chão, beijando as duas bochechas de Louis, que estavam molhadas pelas lágrimas de ambos.

“Louis... Você... Como sabe quem eu sou?!” finalmente conseguiu perguntar, com um enorme sorriso.

“Você é o meu pai! Eu SABIA que você ia aparecer, tinha certeza!! E eu sonhei contigo, pai... Eu sabia como você era!” Louis atropelava as palavras. Não conseguia soltar o terno do pai, que naquele momento nunca haveria de se importar com os amassados provocados naquela roupa tão cara. Nada além da felicidade de encontrar o filho passava pela cabeça de Yuudai.

...

Horas mais tarde, Yuudai estava na sala junto aos outros moradores da casa. Louis não se afastara do pai em momento algum, fazendo questão de apresenta-lo para todos. Mas naquele momento, as energias do loirinho já haviam terminado, e ele cochilava tranquilamente ao lado de Yuudai, no sofá. Sua cabeça estava apoiada na perna do pai, enquanto babava no terno dele.

Faziam perguntas curiosas à Yuudai e tentavam deixa-lo à vontade.
Certo, talvez nem todos tivessem ido tanto assim com a cara dele, para tentar “deixa-lo à vontade”. E digamos que a antipatia que ele sentiu pelos dragões era recíproca...

- Então, você disse que trabalhava em que mesmo? – Yuudai dirige a pergunta a Luke, bebendo mais do vinho em sua taça, oferecido por Hell.

- No momento eu não tô trabalhando... – Luke não sabia (e nem queria aprender) a dissimular seus sentimentos. E isso explicava a cara de poucos amigos.

- Hm... Você tem nível superior? – prosseguiu com o interrogatório. 

- Não, porque eu odeio estudar. – disse secamente, e deu um gole na lata de cerveja que segurava.

Cain estava próximo, e observava o clima tenso entre os dois. Resolveu interferir antes que algo acontecesse (leia-se: que Luke fizesse alguma coisa).

- Oi, gente! – Cain sentou ao lado de Luke, no outro sofá. Sorria simpaticamente e confiava no poder tranquilizador de sua voz suave.  – Luke, contou pra ele sobre quando Chihiro apareceu?

Luke sorriu imediatamente, como se não tivesse acabado de passar por nenhuma situação desagradável. Cain sabia que a mera menção ao nome de Chihiro já traria um sorriso ao rosto do melhor amigo.

E, desse modo, o angelical demônio havia conseguido salvar a situação. 
Ele, Luke e Yuudai conseguiram manter uma conversa razoavelmente tranquila, apenas com alguns atritos aqui e ali.

Yuudai havia pedido a Nana que o deixasse dormir ali por um ou dois dias, até que seu apartamento estivesse pronto para recebê-lo (Yuudai não se sentia bem em meio a bagunça, não conseguiria dormir direito cercado por caixas).

Obviamente, a irmã não só aceitou o pedido de bom grado, como insistiu para que Yuudai morasse ali com ela.

“Não, Nana, eu realmente não quero atrapalhar... Já comprei o apartamento, não é longe daqui. Basta pegar o metrô, duas estações e um quarteirão de distância.” ele respondia, até que Nana acabasse desistindo.

Já estava bem tarde.
Embora as crianças (com exceção de Louis) alegassem que não conseguiriam dormir por estarem agitadas demais, todas acabaram indo para suas camas.

Nana havia preparado um colchonete para o irmão num pequeno quarto do segundo andar. Era onde Kratos dormiria também. 


- Pai, você também não foi com a cara do almofadinha, né? – Luke perguntou à Kratos, emburrado.

Estavam ambos na cozinha, pelo jeito eram os únicos acordados na casa.
Luke estava fazendo um de seus lanchinhos de antes de dormir. Misturava leite, sucrilhos, açúcar, calda de chocolate, chantilly, e muito mel numa tigela. Kratos estava sentado, esperando que o filho acabasse de comer. Não estava com muito sono também.

- Hm... Não sei. Confesso que ele não me convenceu muito. Ele tem cara de quem tá sempre escondendo alguma coisa. Tem cara de pessoa estressada que é uma pilha de nervos... Ou seja, o tipo de chato pro qual não tenho paciência. – comentou, rindo.

- É, concordo. Ele se acha muito! Viu o modo como fala comigo? Esse cara é um babaca.  – falava de boca cheia, ocasionalmente derramando a estranha mistura extremamente doce na mesa. – Não gosto de gente convencida, não. O máximo que consigo aturar é você. – riu.

Kratos riu também, mostrando o dedo do meio.

Quando Luke finalmente acabou de comer, pegou o frasco de mel e o entornou direto na boca.

- Porra, Luke... Vou dormir, tá? Se ficar esperando você acabar de comer, fico aqui até de manhã... E vomito antes.

- Tá bom, velho, vai lá... Boa noite e boa sorte pra aturar o almofadinha.  – Kratos respondeu com outro “boa noite”, e subiu.

Chegando ao quarto, percebeu que Yuudai também estava acordado.
Falava no celular, muito irritado. Controlava-se para não levantar o volume da voz.

- Como... Mas o que? Não, não! Você... Sim, eu te pedi que... – parou de falar, e enquanto ouvia parecia estar indignado e furioso. – Certo, muito obrigado. Tchau. – desligou o celular e o jogou dentro da única mala que carregava. – Filho da puta! – passou a mão na cabeça, jogando o cabelo para trás.

- Problemas? – Kratos perguntou, encostado a porta

Yuudai já não havia gostado nada do jeito de Kratos. Parecia estar sempre o analisando.
E o que fazia ali na porta? Porque havia ficado sem se manifestar, ouvindo-o ao celular?
Pra completar, o ar de riso com o qual lhe perguntara só fazia com que Yuudai o achasse ainda mais desagradável.

- Sim. – respondeu de cara amarrada.

O ambiente estava um pouco tenso.
Na verdade, Yuudai percebeu que gostava menos de Kratos do que de Luke.
Kratos parecia, de algum modo, perigoso. A presença dele deixava Yuudai desconfortável.
E Kratos sentia algo semelhante com relação à Yuudai.
Os dois eram cautelosos, desconfiados e um tanto arrogantes.

Mas a primeira noite passou tranquila, com toda a casa enfim se entregando aos braços de Morfeu.



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