quinta-feira, 29 de novembro de 2012

36. Tempestade


Não era tão tarde, embora parecesse. O dia nublado e frio é que havia escurecido rápido demais. E enquanto a chuva apertava lá fora, dentro do apartamento uma outra tempestade se formava.
Estava tudo bem até poucos minutos atrás, quando Kratos e Yuudai se beijavam no sofá. Até que Yuudai recomeçou suas insistentes e cada vez mais freqüentes investidas. 

- Para...! - Kratos disse por fim, irritando-se. Empurrou Yuudai, retirando as mãos do outro de si. Esticou a camisa, cobrindo o pequeno pedaço de sua barriga que Yuudai havia conseguido revelar. - Mas que merda, Yuudai!

Ele não era o único que havia se irritado. 
Yuudai sentia a própria paciência chegando ao limite.

- Porra, Kratos! Até quando vai ficar de palhaçada? - disse de uma vez. Tentou se controlar ao respirar fundo e passar a mão no cabelo. 

Kratos o olhou descrente.
Yuudai pensava que Kratos gostava dessa situação? Não pensava que ele também gostaria de sentir confortável e simplesmente tirar a roupa? 

- Eu já não falei sobre isso? - diferente de Yuudai, não fazia muita questão de manter o controle. Sua voz soou quase como um rosnado. - Eu que deveria estar irritado, você não me leva a sério!

- Quem parece não estar levando as coisas a sério é você. - lhe lançou um de seus olhares autoritários, que Kratos detestava. - Você faz ideia da minha frustração? Claro que não, você não sabe há quanto tempo estou sem...

- Foda-se! - o interrompeu, imaginado onde aquela conversa daria. - Se o problema é esse, abre a merda da agenda do seu celular e liga pra qualquer uma delas! Você só conhece esses projetos de prostitutas mesmo, nenhuma delas te faria esperar muito pelo que você quer. 

Yuudai se surpreendia com o que ouvia, e estava a cada momento mais irritado com a falta de compreensão de Kratos. Tão irritado que tornava-se cego diante de sua própria incompreensão. 

- Talvez eu devesse fazer isso mesmo, não é? - recebeu imediatamente um olhar raivoso do outro. Se fosse qualquer outra pessoa no lugar de Yuudai, teria sentido medo. - Você não faz ideia de quantos convites ando recusando.

- Faço sim, seu filho da puta. Sou eu que atendo o telefone quando você não tá em casa, e digo pra elas ligarem depois porque você tá ocupado. - o ódio que sentia dessa situação era explicito em sua voz.

Yuudai sorriu, e Kratos sentiu vontade de lhe dar um soco.

- É, pelo menos elas não ficam de frescura que nem você.

- Frescura?! - repetiu, incrédulo no que ouvia.

- Porra, claro que é frescura! - aumentou o tom de voz, esquecendo da pose e deixando por fim que sua frustração e impaciência falassem mais alto. - Duvido que você tenha ficado nessa enrolação toda quando era com alguma mulher! 

- Do que... Você está falando? - sua confusão era sincera.

- ...Então não entendo porque age assim quando tá comigo! - continuou. - Parece mais um garotinho virgem. 

Alguns segundos se passaram em silêncio, onde Kratos se sentiu verdadeiramente desconfortável. Não sabia bem o que sentia, era algo como uma mistura de inseguranças, vergonha, e decepção. 
Só sentia vontade de sair dali e não olhar mais para Yuudai.

- E talvez eu seja só isso mesmo. - disse por fim.

Andando rapidamente, foi até a janela da sala e abriu toda.

- O que você tá fazendo?! - Yuudai perguntou ao ver que a chuva havia se transformado de fato num temporal, e pela janela as muitas gotas que entravam molhavam tudo que alcançavam no interior do apartamento.

- Eu tô indo embora, Yuudai! Faz a merda que você quiser... - e pulou para fora.

Por um momento Yuudai esqueceu que Kratos não era humano, e correu apavorado até a janela, pois morava no sétimo andar. Mas viu Kratos andando na calçada lá embaixo, atravessando a rua e se afastando rapidamente do prédio, logo desaparecendo em meio a chuva e a escuridão.

A primeira reação de Yuudai foi ficar com mais raiva ainda, considerando aquilo tudo uma pirraça ridícula. Sentou no sofá e ficou pensando sem parar, em meio ao silencio do apartamento, que só era quebrado pelo som da chuva que batia no vidro da janela agora novamente fechada.

"Daqui a pouco ele volta pra cá, encharcado. Vai ser ridículo ele aparecer na portaria assim, mas o problema é dele... Não vou deixar essa janela aberta, molhando a sala toda, enquanto ele brinca de ser teimoso..."

Sem sentir, Yuudai acabou por dormir ali mesmo no sofá.
Quando acordou já era manhã, e a primeira coisa que fez foi procurar por Kratos na casa toda, mas não havia sinal dele.

Sua preocupação foi aumentando. E mais que isso, sentia-se arrependido. As horas que passou sozinho na noite anterior, antes de pegar no sono, serviram para que começasse a enxergar as coisas de outra forma.

"E talvez eu seja só isso mesmo." 
Foi a frase que fez com que parasse para pensar.
Não havia considerado antes a possibilidade de Kratos ser virgem, mas agora percebia que fazia sentido. Ora, não fazia ainda nem um ano desde que Kratos havia assumido sua forma humana.

Começava a perceber também que talvez estivesse agindo de forma muito insensível com relação as cicatrizes. Tinha mais ou menos uma ideia de como elas eram, pois com o tempo Kratos havia começado a se sentir um pouco mais confortável na presença de Yuudai, e por isso se deixou ser visto de camiseta sem mangas algumas vezes. O japonês pode perceber então que eram cicatrizes diferentes de qualquer uma que já tivesse visto, devido principalmente a cor avermelhada que contrastava com a pele. Eram também mais irregulares que o normal. Essas diferenças se deviam ao fato de que o fogo que as causara era diferente, e sequer existia na Terra. Logo, seria lógico pensar que tal fogo provocasse marcas diferentes também. 
As outras cicatrizes que já havia visto espalhadas pelos braços de Kratos haviam sido provocadas por suturas muito rústicas. Tinha vontade de perguntar a origem de varias delas, mas sempre segurou a curiosidade.

A questão é que talvez Kratos tivesse motivos para hesitar tanto em mostrar o corpo todo. E talvez Yuudai devesse ter respeitado mais esses motivos.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

35. Vários Lukes

Olá, gente! 
Primeiro, quero agradecer por lerem o blog, e por todos os comentários e mensagens. Obrigada mesmo!

Só quero falar que as primeiras histórias que escrevi sobre esses "personagens-dolls" foram sobre a infância/adolescência do Luke e da Nana no colégio interno inglês onde cresceram, e depois sobre a história de Cain e como ele se transformou num demônio. Mas essas histórias antigas eram um tanto confusas, porque eu bagunçava muito a ordem cronológica. E muitos desses textos se perderam. =/
Mas de vez em quando pretendo abordar o passado deles um pouco.

Essa história de agora é uma dessas, onde vou falar um pouco sobre coisas que já aconteceram.

Beijos, té mais! :D
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Como todo ruivo, Luke tinha sardas. Mas as dele eram poucas e discretas, geralmente se tornando mais evidentes quando seu rosto estava todo avermelhado.
E foi com essa aparência que ele disse à Nana, baixinho, olhando-a nos olhos.

- Ei, eu te amo. – ele sorriu timidamente.

Nana sentiu seu coração explodindo por dentro, sentiu-se derretendo, sentiu os braços arrepiados, sentiu... Uma vontade avassaladora de beijá-lo.
Não importava quantas vezes ouvisse aquela frase, sentiria toda essa mistura confusa de emoções, que a fazia sorrir.

- Também te amo, Luke... – ela sorriu, tocando na bochecha dele. 

Uma das características de Luke que Nana mais amava, era o jeito sincero dele.
Quando sorria daquele modo, chegava a parecer uma criança. Havia algo especial nele, um tipo de inocência quase infantil, que brilhava nos olhos amarelos. Nesses momentos, seria impensável afirmar que aquele rapaz já havia ido para uma guerra ao lado do pai, que ele já havia matado e quase sido morto diversas vezes, defendendo um planeta que não era o dele, mas que tinha importância para si.

Ninguém ousaria dizer também que aquele rapaz, que conseguia sorrir daquele modo, havia tido um passado conturbado. A vontade que ele tinha de chamar a atenção, de ter sua presença notada e seu nome conhecido, o levaram a se misturar com as “más influências” da escola. Sendo que, na verdade, a principal “má influência” era o próprio Luke. Era ele quem liderava as pixações e os furtos em supermercados. Foi ele quem iniciou os jogos de cartas com apostas sérias na escola, era ele quem os supervisores mais encontravam metido em brigas, e foi ele o aluno que mais ficou em detenção por ter sido pego fumando cigarros. E tudo isso por volta dos quatorze anos.

Apesar de conhecer Nana desde o C.A., nunca haviam sido amigos. Sequer se davam bem.
Mas foi aos dezesseis anos que passaram a conversar, e principalmente, a se tornarem amigos.
Luke parou de andar com os meninos que sempre o acompanhavam... Com exceção de Cain. Por sinal, Cain não foi um amigo muito próximo durante essa “fase negra” de Luke, que durou menos de três anos. Ele não o incentivava a fazer as coisas que fazia, e não gostava dos novos amigos de Luke.

Mas com a aproximação de Nana, uma reaproximação de Cain foi possível.
E a partir daí, Luke mudou.
Mudou drasticamente, chegando ao ponto de enfrentar seus “ex-amigos” diversas vezes, quando os via intimidando alguém. Sentia-se culpado, pois fora ele mesmo quem fizera aqueles garotos se tornarem bullies.

O tempo passou, e o que sentia por Nana foi mudando.
Felizmente, era correspondido.
Infelizmente, havia um poderoso dragão chamado Alkrazar que não queria vê-lo feliz.
E tentou vê-lo morto. Mas não obteve sucesso, pois nunca conseguiria ser mais forte que Luke, Nana, Cain, Hell, e Kratos juntos.

Mas... Isso é história pra outro dia.

34. Confissão


Luke cantava a música da banda System of a Down que ouvia em seus headphones. Ignorava os olhares que recebia, parecendo perdido em seu próprio mundo.
Um cara como ele, cantando (mal) uma música em inglês, definitivamente chamava a atenção.

- We’re cool! In denial! We’re the cruel regulators smoking cigaro, cigaro, cigaro! – ele cantava, balançando a cabeça ao se deixar levar pela empolgação desta parte da música.

Olhou ao redor.

- Pera... Onde eu tô? – percebeu que provavelmente havia passado da entrada do apartamento.

Abaixou os fones, e olhou atentamente para os números das casas da calçada onde estava.
Logo, percebeu que não estava muito longe, e não demorou a encontrar a entrada do apartamento.

*

Kratos atendeu a porta, e Luke o saudou com o enorme sorriso de sempre.

- Conte-me o que te aflige, velho dragão! – disse em tom de brincadeira, jogando-se no sofá e mudando de canal.

Luke não estava tão à vontade apenas porque Yuudai não estava em casa no momento.
Quando Yuudai estava lá, ele se comportava da mesma forma mal educada também.

- Hm...? Como assim? – riu sem graça, coçando a cabeça. Sentou ao lado de Luke.

- Eu te conheço... Pra você me chamar aqui, tem alguma coisa importante que quer me contar. Dava pra perceber pela sua voz, mas não foi só isso... Você normalmente teria aproveitado pra ir até lá em casa e visitar o pessoal, mas você preferiu que eu viesse aqui, quando você tá sozinho. – ele sorriu vitorioso, parecendo orgulhoso de suas conclusões. – Deve ser um segredo, e eu tô curioso!

Kratos não pode deixar de rir também.
Afinal, Luke acertara em tudo.

- Certo... – pensava em como falar. Não havia se preparado bem para este momento, sentia-se nervoso e um pouco envergonhado.

- Se quiser, fala depois. – sorriu, compreensivo. Não fazia ideia do que o pai queria falar, mas percebia que o assunto o deixava desconfortável.

- Não, eu acho melhor... Falar logo.

- Go ahead! – ignorava a televisão, inclinando-se na direção de Kratos, demonstrando seu interesse.

- Eu estou apaixonado. – sentiu o rosto ficar vermelho.

Luke arregalou os olhos e abriu um sorriso que mostrava até mesmo seus caninos, que eram mais afiados que o normal, assim como os de Kratos.

- Opa!! Porque quem?! Me conta tudo, porra! – ele deu um soco animado no braço de Kratos. - Você conheceu no Maisonette??

- Não, não... – olhou para baixo. – É pelo... Yuudai.

O sorriso de Luke sumiu por um momento. Lançou ao outro um olhar confuso.
Um segundo depois, riu descontroladamente, jogando a cabeça para trás.

- Não, mas sério... Fala sério agora, velho... – conseguiu falar entre risos. – Me conta logo, que eu tô mais curioso ainda!

- Eu estou apaixonado pelo Yuudai. – disse com a voz firme, o rosto sério.

Dessa vez, Luke parou de rir e olhou atentamente para o outro, procurando por sinais que indicassem uma possível mentira.

- É sério mesmo?

- Sim. – sentiu o rosto esquentar novamente.

Luke olhou para baixo, abrindo a boca num sorriso incrédulo.
Kratos aguardava sua reação, sentindo-se mais ansioso a cada segundo.

- Cara... – ele riu, passando a mão pelo rosto. – Eu nem... Nem sei o que dizer.

Ainda sustentava o ar de riso, mas o modo como falou indicava o quanto havia sido pego de surpresa.

Respirou fundo, pensando no que falar.

- Kratos, você sabe que eu tô contigo, agora e pra sempre. – deu um tapa no braço do outro, que sorriu aliviado. - Vai fundo! Quero te ver sendo muito feliz com esse japonês, se for isso que você quer! – abraçou Kratos.

- Obrigado pela força, cara... Obrigado mesmo.

- Para com isso... Não tem que agradecer nada. Eu quero é que você me conte direito a história... Ele já sabe?

- Sabe, sim... Quer dizer, eu nunca me declarei, nem nada assim. Mas faz umas duas semanas desde que eu beijei ele. Aí desde então a gente tá nessa...

- Ahh, viado, esperou duas semanas pra me contar! – bateu no outro com força, usando uma das almofadas do sofá. – Opa, agora não posso mais te chamar de viado!

Os dois riram, e Kratos sentia-se extremamente aliviado.
As reações de Luke estavam sendo ainda melhores do que havia imaginado.

- Mas... E aí? Quando todo mundo vai saber? Quando vão se casar?

- Casar? Haha... Tá doido. Tenho certeza que ele também não quer saber de compromisso. E outra coisa, eu não sei nem se a gente tá namorando... – chegou num assunto que o incomodava. A verdade é que não sabia o que Yuudai queria dele.
Não sabia como Yuudai enxergava o relacionamento deles.

- Não esquenta com isso. – disse imediatamente, parecendo ler os pensamentos de Kratos. – Deixa rolar, as coisas se resolvem. E se você achar necessário, chega de uma vez e pede ele em namoro.

- Sim, você tá certo. – sabia que chamar Luke havia sido a decisão certa. Ele realmente estava se sentindo melhor sobre tudo que estava acontecendo. – E eu acho que ele pensa que nem eu, sobre os outros saberem... Tipo, a gente não quer manter um segredo. Mas também não queremos que todos saibam... Não agora. Quer dizer, se nem eu mesmo sei o que tá acontecendo, não tem porque explanar nada ainda.

- Tá certo então. Não vou falar nada pra ninguém, nem o Cain vai saber. – sorriu.

- Sim, eu confio em você. – retribuiu o sorriso. – E tem... Mais uma coisa. – olhou para baixo e franziu as sobrancelhas, parecendo incomodado. - Cara, as minhas cicatrizes...

- Ah, não começa com isso não! – Luke o interrompeu. – Eu já te disse que você devia ter um pouco mais de autoestima, e um pouco mais de foda-se ligado!

- Falar é fácil... – comentou desanimado.

- E outra coisa, tenho certeza de que o Yuudai não é superficial. – disse com convicção. - Quer dizer, ele é! Porque ele tem aquele lado de gostar de coisas caras, de se importar muito com dinheiro, de manter aparência... Mas fora essas merdas todas, eu realmente acho que ele não é nada superficial, não com relação a você.

- Hm... O que você quer dizer com isso?

- Ah, ele não era bissexual, né? Ele só pegou mulheres a vida toda, não foi?

- Sim, ele já me disse isso. Nunca tinha se interessado por nenhum homem antes... Bem, e nem eu. – sorriu sem graça.

- Então!

- Então o que? – o olhou confuso.

- Porra, você é importante! Você é muito especial pra ele, cara. Foda-se as cicatrizes! – sorriu abertamente.

Kratos não disse nada, tentando em vão entender a lógica do outro.

- Sei lá, espero que você esteja certo. Tem dado cada vez mais trabalho esconder dele... Acredita que ele já tentou me flagrar no banho, se aproveitando que a gente não tem o costume de trancar a porta? Eu tive que pegar a porra da toalha numa velocidade ninja!

- O cara é esforçado! – Luke riu, sem conseguir imaginar esse lado de Yuudai. – Mas sério, relaxa! Daqui a um tempo você vai estar rindo dessas preocupações, escreve o que eu to dizendo...

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

33. A Ilha dos Piratas


- Hell, larga essa garrafa...  – Cain disse entre risos.

Estavam saindo do salão de festas principal do hotel. Não faziam ideia de que horas eram, mas o sol já havia sumido há muito tempo. Foram para o gramado,deixando para trás a música alta e o som de conversas e risadas.

- Eu só largo... Ui! – ela escorregou na grama úmida, caindo sentada no chão. – Só largo... Quando a garrafa estiver vazia! – ela ria, sentada na grama. Cain sentou ao lado dela, tomando a garrafa de suas mãos e bebendo no gargalo.

- Eu acho que não estamos sóbrios... – comentou distraído, olhando as estrelas.

- Isso quer dizer que... Você não vai ficar resistindo que nem uma donzela virgem hoje? E vai me deixar sugar teu sangue até você ficar pálido? – ela disse, sorrindo sinistramente. O brilho de seus olhos, que conotava uma paixão violenta, não disfarçava suas intenções.

Cain sentiu o rosto ficar quente, e desviou o olhar de Hell, bebendo mais uma vez.

- Ah, Cain... Você sabe, eu faço sem você sentir dor. – disse sedutoramente, aproximando-se do pescoço do namorado e puxando a gola de sua camisa.

- Hell, não..! Não aqui... – olhou ao redor.

- Qualquer um que visse, acharia que estou apenas dando um chupão no seu pescoço. E não é muito diferente disso, não é verdade? – ela riu.

- E como eu voltaria para o quarto com essa camisa suja de sangue...?

- Desde quando desperdiço uma gota sequer do teu sangue, demônio estúpido?! – bateu no ombro dele. – Às vezes penso que você usa sempre roupa branca apenas para me inibir de atacar sua jugular...

- Não fala merda, e deixa de ser tão egocêntrica. Eu sempre gostei de branco. – disse, levemente irritado.

Ela riu de forma escandalosa, jogando a cabeça para trás.

- Cain, Cain... Não seja tão mal humorado. Você devia ter bebido mais...

Ele não a respondeu, voltando a fitar as estrelas.
Hell se aproximou mais, abraçando-o.

- Meu lindo demônio... Sabe que não vou te forçar a nada, que seu sangue é apenas seu, e você o divide comigo quando quiser.

Ele virou a cabeça para o lado, beijando os cabelos vermelhos.

- Ei... Cain! Olhe lá! – apontou para frente.

- Que foi, quer nadar?

Mais a frente, o que se via era a praia privada do hotel.
- Não, mais além! Não vê aquela montanha? Que parece estar numa ilha?

- Meus olhos não são tão bons quanto os seus...

- Deixe de má vontade! Aposto que tem uma visão até melhor que a minha... Aquela montanha, não se lembra dela?

Cain olhou com mais atenção para a direção indicada.

- Aquela é... A montanha onde tem aquela caverna? De uns mil anos atrás?

- Só pode ser, é o mesmo formato! Cain... Vamos até lá!

- Agora?

- Agora! Capitã Bonnie volta à ativa!

- E devo voltar a ser seu humilde escravo capturado próximo à ilha Madagascar?  - disse com um sorriso irônico.

- Não... Desta vez, lhe permito subir de posto. Pode ser meu escravo sexual, capturado próximo à ilha Madagascar.

Cain riu, balançando a cabeça.

- Devo realmente estar meio bêbado, para concordar com isso... Mas vamos lá.

Faz-se necessária aqui uma breve pausa na história, para que as devidas explicações sejam dadas.

Cain fez uma promessa ao dragão Kratos, ainda na época em que vivia como um demônio recém-transformado, no chamado “Egito Antigo”. Prometeu que aguardaria que mais de dois mil anos terráqueos se passassem, até que “Luke, o escolhido”, nascesse. Para que não precisasse esperar, literalmente, os dois mil anos, Cain era enviado para diversas dimensões, onde o tempo “corria mais rápido” em relação ao planeta Terra. E Hell sempre o acompanhou.

Sendo assim, ao invés de ter esperado dois mil anos, Cain aguardou cerca de duzentos anos.
Várias vezes, nesse meio tempo, “visitava” a Terra e vivia um pouco aqui, para que acompanhasse a evolução dos humanos terráqueos.

Certa vez quando estava na Terra, Helleh se passou uma pirata, chamada Bonnie. E Cain fez o papel de um escravo capturado, que lhe servia fielmente. Mas a vida de pirata não durou tanto, pois o navio fora destruído pela Marinha Inglesa. Hell e Cain conseguiram escapar do massacre que fora realizado em seu navio. Fugiram para uma ilha próxima, e se abrigaram numa caverna.

E foi nessa caverna onde fizeram amor pela primeira vez.

Agora, voltemos à história.

- A água tá fria... – Cain resmungou, após tirar os sapatos e por os pés na água do mar.

- Como você reclama! Vai, entra logo... – ela também havia tirado os sapatos, e entrava de uma vez na água com seu vestido curto e as meias arrastão que iam até os joelhos.

Fechou os olhos e mordeu os lábios ao sentir a água fria envolvendo seu corpo.
- Entra, Cain! – chamou-o novamente.

- Certo... – ele fala hesitante e tira a camisa, deixando-a jogada na areia, ao lado dos sapatos.

Cain corre em direção a água e entra também, xingando diversos palavrões ao fazer isso.

- Vamos apostar uma corrida até a ilha, assim a gente esquenta!

- Você é bem mais rápida que eu, isso é injusto...

- E você é um demônio, Cain! Pare de ignorar isso o tempo todo! Você pode ser tão rápido quanto eu, ou até mais... Só que você nunca usa sua força, sua velocidade, nem nenhuma outra característica especial, só porque não queria ter sido transformado em demônio!

- Tá bom, Hell... Não estou com vontade de ouvir mais um desses sermões. Revirou os olhos, e mergulhou a cabeça na água, para molhar de vez todo o cabelo e jogá-lo para trás. – Vamos logo. – ele sorriu ao emergir.

Os próximos minutos foram alucinantes.
Aqueles dois levaram a sério a corrida, e nadavam esforçando-se ao máximo. De fato, suas velocidades eram semelhantes. Mas Hell se manteve a frente, na maior parte do tempo.
Engoliam água, sentiam os olhos arderem por causa do sal, mas seguiam em frente.
Quando já se aproximavam da ilha, Cain sentiu seus músculos próximos à exaustidão, mas pelo modo como Hell não diminuía a velocidade, ela não parecia se sentir do mesmo jeito.

Cain parou, pois não conseguia seguir em frente. Hell não percebeu.
Ele pensou em chamá-la, mas não conseguiu reunir forças para gritar.
Sentiu-se afundando, e em breve não sentiu mais nada...


...



- Cain! Cain, por favor... Cain...! – ele ouviu a voz de Hell o chamar.

Abriu os olhos lentamente, e viu a vampira com o rosto todo sujo de sangue.

- Hell...?

- Seu idiota, não faz mais isso comigo... – ela continuou chorando, mas ria aliviada.

Helleh enxugou suas lágrimas de sangue, limpando as mãos no vestido, que também já estava todo sujo.

- Desculpe, eu não sei o que houve...

- Você quase se afogou, foi isso que houve!

Cain a conhecia muito bem. Sabia que ela estava se sentindo extremamente culpada, e por isso sorriu de modo tranquilizante, levantando o corpo e sentando em frente a ela, que estava sentada em cima das pernas, com os joelhos dobrados.

- Obrigado por me salvar! – ele a abraçou, e Hell se desmanchou em seus braços, segurando-o com força, e o sujando com suas lágrimas sanguinolentas.

Ficaram assim por algum tempo, até que Cain a soltou.

- Vamos pra água um pouco? Você precisa lavar o seu rosto, e seu vestido. – ele sorriu.

- Não se preocupe... Vou com cuidado. – ela sussurra gentilmente, e Cain fecha os olhos ao sentir os caninos roçando na pele de seu pescoço.

Cain a abraça, sufocando um gemido, enquanto tem seu pescoço perfurado mais uma vez.

A corrente e a coleira de couro fino que sempre lhe cobriam o pescoço jaziam esquecidas no chão. Enquanto o dono delas ignorava a terra e a areia desconfortáveis que grudavam em sua pele, ainda úmida pela água do mar. Algumas pequenas pedras espalhadas pelo chão da caverna também lhe machucavam um pouco.



Sentia como se tivesse voltado centenas de anos atrás... As sensações eram ainda as mesmas. Ambos haviam mudado muito, mas o que sentiam um pelo outro continuava sendo o mesmo amor. Talvez, apenas mais maduro.

A verdade é que quando estava com Hell, detalhes como frio, terra, e pedras lhe incomodando nas costas conseguiam ser ignorados com facilidade. E o mesmo valia para a vampira, que sentia que poderia suportar de tudo desde que estivesse com Cain.


domingo, 18 de novembro de 2012

32. Olhares


Horas mais tarde, quando já era noite, Yuudai abriu os olhos.
De início se assustou com a posição em que estava, mas logo lembrou do que havia acontecido. Dormira com o corpo encolhido contra o de Kratos, a cabeça acomodada no braço estendido do dragão. Não pôde deixar de ficar com vergonha ao notar que havia dormido com um braço por cima do peito dele, como se estivesse tentando abraça-lo.

- Finalmente acordou... – disse Kratos, sonolento.

- E você está acordado há quando tempo? – sua voz saía rouca e a garganta ardia um pouco. Provavelmente estava ficando resfriado.

- Alguns minutos... Aí eu fiquei te olhando. –  parecia tímido ao próprio comentário.

- Coisa de psicopata. – sorriu.

Ainda sonolentos, permaneceram na mesma posição.
Yuudai tocou na parte do cabelo de Kratos que sempre lhe cobria um dos olhos, afastando-a dali. Pela primeira vez pôde ver a extensão da cicatriz que o dragão tinha no rosto. E pela primeira vez sentiu a intensidade de estar sendo analisando pelos dois orbes hipnotzantemente amarelos. Ainda mais naquela proximidade, os olhos de Kratos se tornavam ainda mais devastadores. Yuudai sequer piscava ao admira-los.

E Kratos igualmente perdia-se em pensamentos a respeito dos olhos de Yuudai.
No início, quando se conheceram, eles o incomodavam. Lhe pareciam olhos demasiadamente críticos, julgadores. De uma profundidade infinita, capaz de observarem até mesmo o que se passava em seus pensamentos.
Mas hoje... A ideia que tinha a respeito deles era um pouco diferente. A profundidade daqueles olhos tão escuros cuja cor da iris se confundia com a pupila agora exercia em Kratos uma profunda atração.

Como se estivesse num transe provocado pelos olhos amarelos, Yuudai levou a mão ao rosto de Kratos, sem pensar no que fazia. Delicadamente contornou sua cicatriz com o indicador, e Kratos piscou pesadamente, demorando um pouco a abrir os olhos novamente.

"Parece que estou fazendo carinho num gato.", Yuudai pensou, considerando as reações de Kratos simplesmente... Adoráveis.

Acariciou o cabelo azul, pela primeira vez prestando atenção em cada detalhe dele.
Os fios eram grossos e um pouco ásperos, tão diferentes da "textura perfeita" que as pessoas costumam tentar alcançar através de cosméticos e tratamentos.

Mas Yuudai gostava.
Aquele cabelo contribuía com o "ar selvagem" de Kratos.
A beleza dele especial, e Yuudai sentia-se cada vez mais hipnotizado por ela.

- Obrigado, Kratos.

- Pelo que? - e ao vê lo sorrir, Yuudai sentiu o coração batendo ainda mais forte. "Como pode ser possível que ele fique ainda mais bonito?"

- Por ter me ouvido... E me ajudado. - sem dar uma chance de resposta à Kratos, o beijou.

31. Desabafo

Nana era realmente incrível! Em quatro dias, Yuudai parecia nunca ter se machucado.
E conforme o tempo passou, Kratos e Yuudai se tornavam ainda mais próximos, entrando num relacionamento confuso onde ambos pareciam querer a mesma coisa, mas ninguém dava o primeiro passo.

Um mês havia se passado desde a briga que levou Yuudai a ficar com um gesso no braço.
Ele ainda não havia conseguido um emprego, mas parecia menos estressado que o normal, embora tivesse voltado a ser um tanto fechado em si mesmo, fumando e se perdendo em pensamentos que não dividia com ninguém.


Não era raro que Kratos percebesse Yuudai quieto demais, pensativo demais, e parecendo triste. Nunca havia perguntado o motivo, mas dessa vez o japonês parecia de fato deprimido.

Ele mal havia saído do quarto no dia anterior, e Kratos não o vira comendo nada.
Deu duas batidas na porta, e entrou logo em seguida, pois não esperava obter resposta. Yuudai estava sentado na beira da cama, fumando e lendo algum livro (provavelmente sobre Economia). Olhou de relance para Kratos, logo voltando a atenção ao livro novamente, sem dizer nada. Vestia apenas a calça que usava para dormir, e seu cabelo estava bem bagunçado. Definitivamente, ele havia se abandonado um pouco nos últimos dias.

- Yuudai, você quer me contar o que está acontecendo? – tentou perguntar num tom casual.

O japonês o olhou novamente, deixando o livro na cama e dando uma tragada.

- Não. – disse simplesmente, e fitou a janela fechada do quarto.

Kratos suspirou pesadamente, e sentou na cama ao lado de Yuudai.

- Eu não reclamo o tempo todo do cigarro só porque odeio o cheiro. É porque te faz mal, também. – arrancou o cigarro da mão de Yuudai, e o jogou no chão, pisando.

Yuudai não manifestou nenhuma reação, apenas olhou para o cigarro amassado e passou a mão no rosto, cansado. – O que você quer, Kratos? Só fala de uma vez...

- Eu já disse. Quero que me conte o que te tortura... Eu sei que tem alguma coisa que você odeia lembrar, mas que volta e meia domina seus pensamentos. Alguma coisa da época da Yakuza, eu imagino...

- Para, para com isso... – irrita-se, e levanta da cama indo até a janela, onde abre a cortina e olha para os carros e pessoas na rua lá fora. – Como se você se importasse.

Kratos ficou pensativo por um momento, olhando as costas nuas de Yuudai.

- Na verdade, eu me importo sim.

Ficaram em silêncio por alguns segundos que se arrastaram como se fossem minutos, até que Kratos viu Yuudai abaixar a cabeça, escondendo o rosto nos braços apoiados no parapeito da janela.

- Yuudai? Por favor, me fala logo o que houve! – pediu com urgência, levantando-se também e ficando o lado do outro.

- Eu não quero... Falar sobre nada disso... – a voz saía abafada.

- Mas vai falar. – disse firmemente, puxando o braço de Yuudai com certa brutalidade e fazendo com que levantasse o rosto.

Sentindo-se encurralado e com vergonha dos olhos já úmidos, olhou para os olhos amarelos que o encaravam sem piscar.
Esquivou-se de Kratos, que ainda o segurava, e sentou na cama novamente.

- Às vezes eu lembro... De quando aquele filho da puta foi morto... De quando eu não consegui realizar meu único objetivo. De quando... Nada mais tinha significado e eu me arrependi de cada coisa que já fiz na vida. Tudo, eu fiz tudo errado... – abaixando o rosto, segurou a cabeça com as mãos, parecia estar chorando.

- Sim, Nana me contou mais ou menos o que você disse à ela, sobre como se sentiu mal. – sentou-se ao lado.

- Mas tem uma coisa que eu não falei pra ninguém... É que eu também, naquele dia, não consegui nem... – era um pouco difícil entender sua voz embargada. - ...Me matar.

- Como assim, Yuudai? O que você fez? – preocupou-se imediatamente. Ele era um suicida?!

- Quando eu soube o que aconteceu... Que os italianos tinham nos traído e matado o filho da puta...  Eu soube através de uma ligação, estava no quarto do hotel.

Yuudai parou de falar, pois fora interrompido pelos soluços de seu choro.
O rosto vermelho e molhado, a voz difícil de sair... Era uma imagem desoladora.

- E então? – Kratos sentia que precisava fazer com que Yuudai falasse tudo de vez.

- Então eu sentei no chão, e fiquei lá por... Não sei, quase uma hora... Ou mais? Não sei... – enxugou o rosto com a mão, desajeitado. – E só pensava em como tudo era... Vazio... Eu me arrependia demais de cada decisão que já tinha tomado na vida... E eu percebi que só queria morrer. Que era o único jeito de sair do vazio. Então peguei meu revólver e enfiei na boca, eu estava preparado... – respirou fundo com um pouco de dificuldade, o choro havia se tornado compulsivo.

Ao ver que Yuudai não estava conseguindo se acalmar, Kratos o puxou para perto de si, abraçando-o. Sentia o corpo de Yuudai tremendo, e por isso o envolveu com força.

- Eu puxei o gatilho... – conseguiu continuar. Kratos não o largou, passando a mão por suas costas, tentando de alguma forma deixa-lo mais calmo. – Mas não aconteceu nada. Aquele homem, ele nunca confiou em mim. Tirou as balas do meu revólver... Além de não ter conseguido mata-lo, ele acabou impedindo que eu me matasse...  Foi como se ele tivesse ganhado de mim, mesmo depois de morto. Não consegui fazer nada que gostaria de ter feito... É disso que me lembro, Kratos. Desses momentos todos... – seu corpo voltou a estremecer, e dessa vez Kratos soltou-o.

“Será que Kratos está com raiva de mim...? Deve estar, agora que descobriu que sou tão fraco...” Yuudai pensava, desesperando-se.

- Você nunca desabafou isso com ninguém? Você nunca se permitiu chorar ao lembrar isso tudo? – Kratos perguntou, olhando-o duramente ao apartar de vez o abraço.

- N-nunca... - gaguejou, enxugando os olhos novamente.

- Você é mesmo um idiota! Como pôde pensar que conseguiria viver normalmente sem desabafar algo assim? Sem nunca por pra fora? Esse tipo de coisa que te deixa doente...

Yuudai sentia novas lágrimas ameaçando escorrer. As palavras de Kratos soavam duras demais para alguém já tão sensibilizado.

Surpreendendo (e muito) Yuudai, Kratos o segurou delicadamente pelo rosto, com uma das mãos.


 - Isso não vai se repetir, Yuudai. - falava mais baixo, de modo mais sutil. Sua voz soava um pouco rouca. – Eu não vou deixar... - Aproximou mais seus rostos, olhando primeiro para os olhos de Yuudai e em seguida fixando o olhar em sua boca. Estavam tão próximos que Yuudai sentia a respiração quente de Kratos contra sua pele. – Eu não vou deixar que você se sinta vazio novamente. Eu quero... – roçou seus lábios nos do outro, que simplesmente não acreditava no que estava acontecendo. –... Te ver feliz, Yuudai. – sussurrou por fim, beijando-o.



Kratos segurou na nuca de Yuudai, aprofundando o beijo. O japonês estava assustado, mas não sentia vontade alguma de impedir o outro. A princípio não conseguiu corresponder, talvez devido ao choque do momento.
Mas não demorou a abraçar Kratos, e passar a mão pelo cabelo curto azul, bagunçando-o.

Sendo empurrado para trás, deitou na cama.

Yuudai nunca sentiu nenhuma aversão à homossexualidade, na verdade nunca nem parou pra pensar muito a respeito. Mas também, nunca na vida havia se sentido atraído por outro homem. Não até ter conhecido Kratos.


- Kratos... –  chamou o nome do outro ao senti-lo beijando seu pescoço e passando as mãos por sua pele exposta.

- Espero que você entenda... - disse, um pouco ofegante. - Que estou ao seu lado, e que tudo vai dar certo agora. – sorria ao falar, sem sair de cima de Yuudai.

- S-sim...  – se seus olhos não estivessem inchados após ter chorado tanto, com certeza estariam bem arregalados. – Kratos... O que a gente tá fazendo? – mordeu o lábio inferior, sentindo o rosto ruborizar.

- Eu não sei direito... Desculpa. – sorriu novamente, sem jeito.  Jogou-se ao lado de Yuudai, deitando também. – Mas que tal a gente pensar nisso depois? Vamos dormir.

A sugestão repentina de Kratos chegou a soar cômica.
... Mas Yuudai de fato sentia-se muito cansado.

sábado, 17 de novembro de 2012

30. Conversas Noturnas


Antes de ir embora com Luke (que havia desenhado no gesso de Yuudai um dragão cuspindo fogo, enquanto Nana e Kratos conversavam), Nana disse mais uma coisa à Kratos.

"Eu não falei isso pro Yuudai pra ele não criar expectativas, porque foi a primeira vez que tentei preparar essa mistura e não sei se deu certo... Mas, se deu, não vei ser apenas o pé dele que vai ficar recuperado .. O braço dele vai ficar bom também em no máximo uma semana!", ela falou discretamente, sem que Yuudai a ouvisse.

Os talentos de Nana no preparo de poções e misturas mágicas eram incríveis. Kratos não duvidava nada de que Yuudai estaria novo em folha, em breve.

Mais à tarde, as crianças passaram também no apartamento. Para elas, Yuudai contou que havia sido assaltado, e aquilo tudo fora culpa dos bandidos. Foi uma visita bem agitada, pois Louis, Marie e Merlot não paravam de falar, e nem de desenhar e escrever no gesso.
Logo, o dragão de Luke e o "Yuu-chan! (.^u^.)" de Nana não estavam mais sozinhos.
Mas não se demoraram muito no apartamento, antes que anoitecesse Kratos os levou à casa de Nana.

...

Durante aquela noite, Kratos não dormiu, para que Yuudai não perdesse o horário do remédio. Mas o próprio Yuudai também havia decidido não dormir, pois não queria dar tanto trabalho ao dragão.

O resultado foi que os dois passaram a madrugada acordados no chão da sala, com as costas apoiadas no sofá, conversando sem parar sobre tudo que passava por suas cabeças.
Foi uma conversa ainda mais longa e mais animada do que aquela em frente à praia. Eles riam juntos, faziam diversas perguntas (Yuudai queria saber mais sobre o Planeta dos Dragões, e Kratos queria saber tudo sobre a vida do outro antes de encontrar a família), e passavam a se sentir realmente à vontade na companhia um com o outro.

- Qual a sua cor favorita? - Yuudai perguntou, rindo.

- Porra, seu estoque de perguntas relevantes já acabou mesmo, né? - ria também.

- Não sei... Eu tô com sono demais pra pensar direito... - ria fechando os olhos e jogando a cabeça para trás. Estava com tanto sono que parecia bêbado, e isso fazia Kratos rir ainda mais também. Ou será que realmente já estava meio bêbado, devido a garrafa de vinho que estava sendo compartilhada por ambos?

- Olha pra mim e tenta adivinhar de qual cor eu gosto.

Yuudai analisou os cabelos azuis, a camisa listrada de mangás compridas também azul, e até a bermuda jeans na cor azul...

- Seria... Azul?

- Você é genial, cara.

Yuudai riu novamente, dessa vez deixando a cabeça para trás apoiada no assento do sofá.

- E aí... Me mostra as suas cicatrizes?

- Não. - respondeu rapidamente, e puxou a garrafa de vinho barato da mão de Yuudai, dando um gole.

- Ah, por que não? Só pra me deixar mais curioso? Afinal, alguém já viu elas?

- Luke é o único. Cain só viu as da frente, que nem você naquela noite na casa da Nana. E pelo modo como você não parou de me torturar zombando delas desde então, nem quero imaginar como você ficaria se visse as das costas. - disse amargurado, pela primeira vez na noite o clima se tornava desconfortável.

Yuudai puxou a cabeça para frente novamente, e olhou para Kratos.

- Você um dia vai conseguir me perdoar por isso?

Kratos ficou em silêncio, olhando para a garrafa em suas mãos.

- Claro que sim. Mas você não pode fazer nada quanto a eu não querer te mostrar todas.

- Se eu não estivesse com esse gesso... - puxou a garrafa e deu um gole. - ... Eu já estava fazendo você tirar sua camisa agora. - sorriu.

- Ah, é? Esqueceu que eu sou muito mais forte que você? Nunca conseguiria me forçar a fazer isso.

- E quem falou em forçar...? Eu ia fazer você querer tirar a roupa... - sua voz soava um pouco embargada, talvez o vinho realmente estivesse fazendo efeito.

Yuudai se aproximou do outro, e com a mão livre segurou o pescoço de Kratos, puxando-o para perto de si. Aproximou o rosto dali, e o beijou próximo à clavícula.
Kratos sentia a respiração quente e pesada de Yuudai em seu pescoço.

- Yuudai... - Kratos o chamou, pondo a mão por cima da do outro. Mas sentiu que Yuudai não se movia. - Yuudai? - chamou novamente, percebendo algo estranho.

Kratos olhou para o lado, e percebeu que Yuudai estava dormindo.
Sim, ele dormira com o braço no peito de Kratos, segurando frouxamente seu ombro. E a cabeça estava apoiada no outro ombro do dragão.

- Bêbado maldito. - Kratos resmungou baixinho, enquanto olhava para o relógio na parede em frente para deduzir quando deveria acordá-lo para tomar o remédio.
Por sorte, a garrafa que Nana entregara já estava quase vazia, em breve ambos poderiam descansar e dormir direito.


sexta-feira, 16 de novembro de 2012

29. Conversa entre Nora e Sogro

Como Kratos previra, Nana realmente foi falar com ele.

Estava na cozinha esquentando uma pizza para as visitas, quando percebeu que Nana havia se aproximado, anormalmente séria.

- Senhor Kratos... Pode me contar exatamente o que houve? Porque fez aquilo? 

Sentia-se muito desconfortável e pensava em qual seria o melhor modo de falar. 
Como contar que havia brigado violentamente com um Yuudai bêbado, para uma das pessoas que mais amava aquele japonês? E pior, que o motivo da briga e da bebedeira do outro haviam sido culpa sua, que decidira destruir a noite de Yuudai?
Respirou fundo.


- Eu não vou mentir nem tentar suavizar nada, você me conhece eu acredito que não existam motivos para que deixemos de ser claros...

- De acordo. - era incrível como a postura séria de Nana quase a transformava em outra pessoa. Mas Kratos já estava acostumado.

- Eu estava irritado demais com o modo como ele me arrastava o tempo todo pras saídas dele, só pra eu dirigir o carro. Ele não é uma pessoa fácil. Você felizmente apenas conhece o "lado irmão" dele... Pra piorar, eu já estava há tempos sem treinar com o Luke, então minha energia acumulada apenas me deixava mais irritado.

 "Tenho que dar um jeito de não precisar contar à Nana sobre o lado promíscuo do irmão dela...", pensou. 
Sim, ele estava tentando proteger Yuudai. Mas não apenas isso. 
Pelo bem de Nana, queria proteger a imagem que ela tinha do irmão.

- Não precisa me contar os detalhes... Eu realmente não quero saber o que exatamente levou à briga de vocês. - ela olhou para baixo. Já imaginava que Yuudai não era o tempo todo aquele bom moço que parecia ser quando estava apenas com ela e Louis. Mas Nana sabia que esse lado amável de Yuudai não era encenação alguma. E por isso mesmo, sentia-se muito feliz em saber que Yuudai conseguia relaxar ao seu lado, e apenas ser ele mesmo.

Kratos se surpreendeu um pouco, mas sentiu-se aliviado.

- Então o que gostaria de saber, na verdade?

- Você... - parecia um pouco confusa, talvez nem ela soubesse bem como se expressar. - Vocês se odeiam? Foi por isso que fez aquilo com Yuudai, é porque odeia ele?

Surpreendeu-se pela segunda vez. 
E o curioso é que Kratos não é de se surpreender facilmente.

- Não, eu não o odeio! E... Bem, não posso afirmar com total certeza, mas acredito que ele também não me odeie. - sorriu, finalmente não havia mais sinal daquela tensão no ambiente. - Mas porque você está perguntando isso?

- É que... Eu não quero que duas pessoas que se detestem se sintam obrigadas a morar juntas, apenas por minha causa. Sei que forcei a barra quando te pedi para morar com Yuudai, eu estava tão nervosa que não pensava direito naqueles dias... E pensando racionalmente agora, vocês não precisam estar sempre juntos para que minha "visão" se realize. - sorriu sem graça, sentia vergonha pois pensava ter reagido de forma exagerada à sua própria visão.

- Tudo bem, Nana. Eu entendo sua preocupação. 

- Então... Se você quiser sair daqui e ir morar de novo lá em casa, não tem problema. Quer voltar? - abriu mais o sorriso.

Kratos sentiu um aperto no peito que não soube identificar.
Ir embora do apartamento? 
Mas... 
Não, ele não queria. 
No fundo ele realmente não queria sair do lado de Yuudai.

- Nana... Eu não quero ir embora. - sentiu o rosto ficar quente. - A verdade é que agora, pela primeira vez, eu e Yuudai estamos nos dando bem. Se ele não se importar que eu continue a morar aqui... Eu continuo. 

Agora foi a vez de Nana ficar sem reação.

- Isso... Bem, eu não esperava ouvir isso. - ela riu. - Mas fico feliz de saber que vocês estão se dando bem! Nesse caso... Faça como achar melhor, senhor Kratos.

Ele acenou a cabeça, sorrindo.

- Sabe, tem uma coisa que tá me incomodando. É Yuudai pra lá, Yuudai pra cá... E de mim, você não sente falta? Nem fala mais comigo. - apoiou-se na bancada e olhou para longe, encenando estar de mal com Nana.

- Ah, seu bobo! Deixa disso! - ria novamente, empurrando o braço do outro. - Outro dragão ciumento, é?

- Ciúmes não, só saudade mesmo. - olhou novamente para ela, sorrindo.


- Eu também estou! Se não estivesse sentindo sua falta, acha que eu estaria toda feliz aqui hoje falando que você pode voltar a morar na minha casa? Mas parece que você prefere meu irmão, né... Essa ele ganhou. - brincou. 

- Ah, para com isso e me dá um abraço logo.

Nana pulou em Kratos, o abraçando apertado.
Era engraçado como os abraços daquela garota pequena e magrinha conseguiam ser fortes!

- Quando Cain e Hell voltarem, vamos todos ao Maisonette! - ela disse animadamente ao soltar Kratos.

"Maisonette 9? Não tenho boas lembranças... Mas quem sabe sirva para que eu enxergue o lugar de outro jeito, pelo menos.", ele pensou.

- Eles ainda estão no hotel? Vida boa, hein! - se referia ao hotel no Hawaii, o qual Hell recebera repentinamente duas passagens da agência onde trabalhava. 

- Pois é, mas eles merecem! - ria alegremente. Essa sim era a Nana que Kratos conhecia e gostava!

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

28. A Visita de Luke e Nana

Após aquele sonho estranho, Yuudai não voltou a dormir.
Havia apenas cochilado rapidamente ao chegar em casa, então decidiu que aproveitaria que ainda era cedo e faria com que Nana soubesse de tudo que havia acontecido.
Não tinha vontade alguma de fazer isso e deixá-la preocupada, mas sabia que seria necessário. Ela ficaria muito magoada se não fosse avisada logo.

- Ei, Kratos... Liga pra Nana e conta o que aconteceu, vou tomar banho agora. - disse, aparecendo na porta da cozinha.

- Tá doido? - ele parou de montar seu sanduíche e o encarou. - Ela vai querer me estrangular pelo telefone... E pior que seria capaz de conseguir! Nunca duvide do poder de uma fada... - arregalou os olhos, dizendo as últimas palavras de forma comicamente sinistra.

- É... Acho que você tá certo, melhor que eu mesmo ligue. Assim, ela também vê logo que eu estou bem. - sorriu, sentindo-se aliviado por ver que Kratos agia normalmente. Temia que a situação entre eles ficasse estranha agora que haviam implicitamente estabelecido uma trégua. Não gostaria que Kratos passasse a evitá-lo, nem nada do tipo.


Uma hora após a ligação, a campainha tocou e foi prontamente atendida por Kratos.

Nana entrou na frente, com uma expressão preocupada, apenas murmurando um "Olá, bom dia." para Kratos. Luke veio em seguida, sorrindo largamente ao ver o pai, e o cumprimentando com um abraço forte e bruto, do tipo que ele só podia dar à Kratos.

- Ele está no quarto? Posso ir lá? - Nana perguntou apressadamente. 

- Sim, se a porta estiver aberta é porque ele já saiu do banho, aí você entra. - sorriu sem jeito. Sabia que Nana ia querer conversar com ele depois.

Quando Nana saiu de cena e Luke se viu sozinho com o pai, começou a rir.

- Caraaa, não acredito! Você resistiu mais tempo do que eu pensava, até! Acho que se fosse eu, já teria metido a porrada nele antes... - ria daquele modo escandaloso e contagiante, que lhe era tão característico.

- É, Luke, mas eu me arrependi... - dessa vez, resistiu a vontade de acompanhar as risadas animadas do filho. Olhou-o seriamente, fazendo com que Luke parasse de rir.

- E porque? Ele vai sobreviver, porra... Tava merecendo uma porradinha mesmo, só pra ficar esperto. - piscou, espreguiçando os braços.

- Talvez... Mas eu exagerei, isso que foi a merda. É que você ainda não viu ele... Tá todo roxo, o olho dele tava quase preto, cara. E além do braço quebrado, tá com um tornozelo torcido também, tá usando aquela bota ortopédica. 

Luke franziu as sobrancelhas, olhando-o confuso.

- Porra, mas o que ele fez pra ter te deixado tão puto? Tipo, eu meio que tava prevendo que você ia bater nele uma hora ou outra, mas não achei que você fosse quebrar ele assim.

- Ah, sei lá... Eu fiz aquilo que tinha te falado, estraguei a noite dele. Mas o idiota bebeu pra cacete e ficou vomitando, aí eu levei ele pra casa, como sempre. Mas aí a gente começou a discutir... E a coisa ficou feia, quando ele me deu um soco. Eu não consegui me controlar muito na hora de revidar.

- O cara tava todo bêbado, velho! Chegando a se vomitar! Você realmente exagerou, hein... Só dele estar bêbado você já devia ter ignorado seja lá o que ele dissesse ou fizesse... - foi sincero.

- É, eu concordo com você. Mas na hora... Sabe como é. - coçou a cabeça, incomodado.

- Tá, mas deixa isso tudo pra trás, já passou. - sorriu. - Agora a Nana deve estar lá no quarto com as macumbas dela. Ela preparou uns negócios estranhos com umas ervas, que segundo ela vão ajudar muito na recuperação do babaca. - achou estranho quando Kratos não riu. "Babaca" era o apelido de Yuudai, usado apenas internamente entre os dragões. Kratos sempre ria ao ver Luke o chamando assim.

- Hm... Não vamos mais chamar ele assim não, cara. - coçou a cabeça novamente. - Sei que é estranho, mas na verdade o Yuudai até que é legal. A gente ficou várias horas conversando depois que saímos do hospital, ele não é tão escroto quanto a gente pensava...

Luke se aproximou de Kratos, olhando-o com os olhos semicerrados.

- Velho... É você? - empurrou a testa do outro com o dedo indicador.

- Para de besteira, idiota... - riu, empurrando a mão de Luke. - Eu tô falando sério... Por mim, dá uma chance pro Yuudai.

Luke o olhou desconfiado por um momento antes de responder.

- Certo... Tudo bem, se você diz. - sorria ao falar. 

- E aí, não quer ir lá pro quarto também?- mudou de assunto.

- Ah, ainda não. Se for lá agora só vou ouvir a Nana falando "Aiin Yuu-chan! Passa essa gosma verde aqui no rostinho onde tá dodói!" - imitou a vozinha fina. - "Yuu-chaaan! Tá doendo? Ai, Yuu-chan! Dragão malvado machucou Yuuzinho, foi?"

Kratos ria com a imitação ridícula.

- Haja ciúmes, hein! Coitada da Nana...

- Ciúmes? De que? Deixa de ser idiota... - parecia uma criança que insistia em negar o óbvio.

- Ah cara, falando sério agora. Você não acha legal a Nana estar feliz? Eles se dão bem pra caramba.

- Claro que acho... - comentou desanimado, olhando para baixo. - É só que... Ele fica dando coisas pra ela, e levando ela e o Louis pra vários lugares legais... Você acha que eu não queria poder fazer isso também? Porque acha que arrumei outro emprego agora...? Mas acho que nem cinquenta anos do meu salário chegariam perto da grana que esse cara tem.

- Ei, não fica assim... Que merda cara, você sabe que te ver triste é deprimente. - reclamou, bagunçando os fios ruivos do outro violentamente, fazendo com que a cabeça de Luke fosse empurrada pro lado.

- Tá bom, foi mal... - riu, passando a mão no cabelo e tirando os fios do rosto. 

- E olha, ele nem tá com essa grana toda. Dinheiro é uma das coisas que mais tá preocupando ele agora...

- O cara não é economista? Dinheiro é sempre uma preocupação...

- Mas não é disso que eu to falando... Ele não tá conseguindo arrumar emprego, e ele me disse que já fez algumas dívidas pequenas pra poder bancar uns passeios e presentes pra irmã e pro filho.

- Que merda... - Luke disse, parecendo preocupado. - E eu aqui com inveja dele... Droga. - parecia arrependido.



No quarto, Nana já havia mostrado à Yuudai todas as pomadas e bebidas especiais que ela havia preparado, e ensinado como usar cada uma. Ela mesma havia passado um gel de cor arroxeada nos hematomas do irmão, que já estavam magicamente desaparecendo.

- Muito obrigado, Nana! Isso tudo vai me ajudar demais. Sério que amanhã mesmo já vou poder tirar essa bota?

- Sim, mas você não pode esquecer de tomar isso aqui de hora em hora. Vou avisar ao Kratos, para que ele te ajude a não esquecer. Se você estiver dormindo, ele vai precisar acordá-lo.

- Tudo bem, muito obrigado. - agradeceu novamente, sorrindo aliviado.

- Mas então... Me diz como você está. - ela finalmente perguntou. Havia entrado no quarto em disparada e foi direto até a cama, apenas cumprimentando o irmão apressadamente enquanto analisava cada ferimento dele. Depois, lhe mostrou todos os "remédios" que ela havia trazido. 

- Tá tudo bem... Acho que a pior parte é que tomar banho nunca foi tão chato! Nem é só por ter que proteger o gesso, é que o braço engessado é o direito, e eu sou destro. - fez uma careta, sorrindo em seguida, a fim de tranquilizar Nana.

- Imagino... - ela passava a unha no gesso distraidamente, curiosa com a textura. Sentada na cama ao lado de Yuudai, apoiava a cabeça no ombro dele.

- Ah, e o gesso esquenta bastante também.

- Quer que eu ligue o ar condicionado?

- Não, não precisa! - disse rapidamente, pois Nana fez menção de levantar. - É que o ar gasta muita energia... A conta vem alta.


- Você está com problemas financeiros? - perguntou preocupada. - Pode vir morar comigo, sabe disso! Bem, não temos ar condicionado lá... Mas por ser no bosque, é um lugar bem fresco!

- Se antes eu não queria dar trabalho, imagina agora que estou desse jeito... - riu. - Não precisa, mas muito obrigado. - deu um beijo nos cabelos cor-de-rosa ao lado.

Ouviram uma batida na porta.

"Entra!", Yuudai disse.

- Fala, cunhado! - Luke entrou sorrindo largamente, e sem cerimonia alguma se jogou na cama, pondo um braço nos ombros de Yuudai.

- Oi, Luke... - disse receoso, pensando em como ainda não entendia o motivo da irmã namorar aquele cara.

- E aí, de boa? - deu uma pancadinha em seu ombro. 

- Opa, foi mal... Claro que não tá de boa né, tá todo quebrado. - ele riu.

Yuudai forçou um sorriso, e Nana tentava segurar seu próprio riso diante do evidente desconforto do irmão. 

- Vou deixar vocês aí, preciso falar com o senhor Kratos. - Nana saiu do quarto.

Yuudai olhava para o lado, desejando que Luke saísse também.

- Bem vindo ao clube! Agora não sou o único da família que o idiota lá já machucou! - ele riu ao indiciar o ombro, que estava sempre enfaixado. - Só que comigo foi sem querer... - disse sem pensar, e tentou se corrigir ao perceber que aquilo havia soado mal. - Quer dizer, não que ele tenha batido em você de propósito...! Tipo, ele bateu de propósito, mas eu quis dizer que ele não queria ter batido tanto... Er... na verdade, eu só tô querendo dizer que...

- Tudo bem, Luke. - Yuudai o interrompeu, rindo espontaneamente. - Eu entendi... Tá tudo bem.

Ficaram em silêncio.
Luke tentava pensar em alguma coisa não idiota para falar, e Yuudai pensava que talvez também tivesse julgado mal o outro, assim como fizera com Kratos.

- Ah, o velho me disse que você gosta dos mangás da CLAMP! - Luke disse de repente.

- ... - "Não, talvez ele realmente seja só um idiota.", pensou, achando que Luke queria provocá-lo. - É, eu tenho alguns. - respondeu seriamente.

- Isso é bem legal! - surpreendeu Yuudai. - Sabia que seu filho adora a CLAMP? Puxa esse assunto com ele, da próxima vez que tiver chance! - surpreendeu de forma bem positiva.

- Ah, é? Eu não sabia mesmo... Valeu pela dica. 

- Pois é, o Kratos pediu pra eu te avisar isso, quando me contou.

- E porque ele mesmo não me disse?

Luke riu, olhando para o lado. Pensava se devia falar ou não... Mas como sua língua costumava ser mais rápida que a cabeça, quando se deu conta já estava falando.

- Não parece, mas ele é tímido, sabe? Acho que foi isso... Ele deve ter ficado sem graça. Isso que ele me contou dos mangás já faz tempo, foi assim que ele tinha se mudado pra cá. Aposto que ele quase não falou nos primeiros dias, ou semanas... Ele é assim mesmo.

Será que era isso?
De fato, Kratos parecia até mesmo evitá-lo naquela época. 
Achava que fosse porque Kratos o odiava... 

Bem, com certeza Kratos o odiava também. 
Mas talvez esse não fosse o único motivo de ter agido daquele modo, sempre tão na defensiva.