sábado, 1 de dezembro de 2012

37. Coragem


Já estava há quase uma hora andando pela rua à procura de Kratos, mas não pensava em desistir. Acabou por encontrá-lo sentado num banco de praça.

Kratos o viu também no mesmo momento.
Mas ignorou-o, desviando o olhar com desinteresse.

- Para com isso. – Yuudai disse assim que sentou ao lado do outro.
Não obteve resposta.

- Kratos, onde você dormiu ontem? – ignorava o fato de estar sendo ignorado.

- Na rua. – respondeu finalmente.

- Sim, mas...

- Sei que você deve estar preocupadíssimo comigo... – o interrompeu em tom sarcástico. – Mas não precisa. Não sei se te contaram, mas já fui mendigo por uns tempos, não tenho problemas com isso.

- Sim, a Nana me falou. Mas não tem necessidade disso agora, para logo com esse show. – mesmo que não fosse sua intenção, sua voz soava autoritária.

Kratos riu amargamente, e balançou a cabeça com um ar cansado.

- Porque tudo que eu faço é sempre “exagero”, “palhaçada”, “show”...? Por isso digo que você não me leva a sério. Você age como se não me conhecesse, como se achasse que sou algum tipo de adolescente mimado. - fez uma pausa, e o silêncio de Yuudai o fez prosseguir. - Eu não vou voltar, Yuudai. Eu realmente não quero. E acho que vai ser melhor pra você também, as coisas vão deixar de ser tão... Confusas. Você pode voltar a ter a vida que sempre teve.

“Mas eu não quero nunca mais voltar a ter a vida que eu tinha antes de te conhecer”, Yuudai pensou imediatamente.

- Então você não quer mesmo voltar?

Kratos confirmou acenando discretamente com a cabeça, olhando para as próprias pernas.

Sem dizer mais nada, Yuudai levantou.
Seu ato repentino chamou a atenção de Kratos, que levantou a cabeça e apenas viu o outro indo embora dali.

“Talvez ele só estivesse esperando mesmo que eu dissesse isso... “ pensou.
Ele não queria se afastar de Yuudai. Ter dito aquelas palavras lhe doeu muito.

Jogou a cabeça para trás e fechou os olhos, com esperança de que os raios de sol daquela manhã que batiam no seu rosto pudessem de alguma forma fazer com que se sentisse melhor.

Perdeu a noção de quanto tempo ficou assim, afinal sentia-se confortável ao esquentar o corpo no sol, depois de uma noite tão fria e chuvosa.

Permanecia de olhos fechados quando algo subitamente chamou sua atenção...
O som de um violino.

Abriu os olhos e os arregalou em seguida ao ver Yuudai alguns metros à frente do banco onde estava. Ele estava ajoelhado no chão com apenas uma das pernas, e essa posição cavaleiresca em que tocava o violino fazia com que parecesse algum princípe de contos de fadas, cortejando uma princessa na torre.
Com a cabeça abaixada, seu rosto ficava escondido por trás do cabelo negro.

Kratos o observava, sorrindo.

Yuudai tocava tão maravilhosamente bem, que não demorou nada até que uma pequena platéia se formasse ao seu redor. As pessoas não entendiam bem o que estavam vendo, mas sentiam que estariam desperdiçando uma oportunidade única se não ouvissem aquele homem tocando naquele momento. O próprio Kratos não tinha vontade alguma de interrompê-lo, embora imaginasse que fosse esse o maior desejo de Yuudai, que com certeza escondia o rosto por estar morrendo de vergonha.

Não era necessário conhecer a música que estava sendo tocada, nem entender de violinos, para perceber que Yuudai era um gênio naquilo que fazia.
Sentindo-se hipnotizado, Kratos observava com atenção cada movimento do outro.

Yuudai estava ali, num lugar público, pela primeira vez na vida permitindo que alguém o visse tocar violino. E o mais importante: Tocava especificamente para uma pessoa. Fato que era nítido, pelo modo como estava abaixado em frente à Kratos.

O dragão notou quando Yuudai começou a se sentir desconfortável. Talvez fosse pela posição, talvez pela quantidade de pessoas ao seu redor que aumentava. E de fato esses dois fatores o incomodavam, mas o pior de tudo era a falta de reação de Kratos, que permanecia sentado em frente à ele.

Com as mãos começando a tremer devido ao nervosismo, errou uma nota.
Parou de tocar e abaixou ainda mais a cabeça, sentindo-se mais constrangido que nunca.

Kratos foi até ele, abaixando-se na sua frente, e levantou seu rosto com as mãos.
Yuudai lhe lançou um olhar um tanto ansioso, um tanto desesperado.
Abriu a boca para falar alguma coisa, e foi esse o momento que Kratos aproveitou para beijá-lo.



As pessoas ao redor manifestaram surpresa, e muitas acenaram negativamente com a cabeça, em sinal de repreensão. Pessoas indignadas, que de algum modo sentiram-se ofendidas (?) deram as costas ao casal.

Até mesmo um ou dois comentários maldosos foram ouvidos. Comentários esses que não receberam atenção alguma de Kratos ou Yuudai, que ignoravam tudo ao redor.

Mas algumas poucas pessoas, livres da cegueira provocada pela ignorância, foram capazes de compreender a beleza do que observavam. Essas sorriram sinceramente, antes de deixar os dois a sós. E continuaram sorrindo por um bom tempo, felizes por terem tido o privilégio de presenciar algo como aquela cena, logo no início de um dia.

- Yuudai, vamos pra casa. – Kratos disse gentilmente, ainda segurando o rosto do outro enquanto sorria.

- Então... Você quer continuar morando comigo?

- Vou te fazer esse favor. Eu sei que sua vida seria um tédio sem mim...

Os dois riram enquanto levantavam, e seguiram juntos em direção ao prédio, ignorando os olhares que receberam ao longo do caminho.

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